quinta-feira, 4 de agosto de 2011

A Arte de Perder



Aqui está um poema que nunca encontrei numa tradução minimamente aceitável. O original em inglês é muito belo. Chama-se «one art». Perder é uma (grande) arte.


Uma arte

A arte de perder não é difícil de dominar,

Tantas coisas parecem encerrar o destino de

serem perdidas que a sua perda não é um desastre


Perde alguma coisa a cada dia. Aceita o incómodo

de perder as chaves da porta, a hora estupidamente perdida.

A arte de perder não é difícil de dominar.


Depois pratica maiores perdas, mais frequentes perdas,

lugares, e nomes, e onde pensaste um dia

viajar. Nada disto trará desastre.


Perdi o relógio de minha mãe. E repara! A minha última

ou penúltima adorável casa se foi.

A arte de perder não é difícil de dominar.


Perdi duas cidades, maravilhosas. E mais ainda,

alguns reinos que possuía, dois rios, um continente.

Sinto falta deles, mas não é um desastre.


Mesmo perdendo-te a ti (a voz que ria, um gesto que

amei) não devo mentir. É evidente

que a arte de perder não é muito difícil de dominar.

Embora pareça (escreve!) pareça um desastre.


Elizabeth Bishop

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Na fronteira



Nada mais avassalador que viver na fronteira, qualquer que ela seja; a fronteira da dor, a fronteira da sanidade, a fronteira da fronteira. Viver entre o nada e alguma coisa. valter hugo mãe sabe...

peçam-lhe que venha tão
depressa, digam-lhe que
não durmo e que estarei
no telhado entristecida a
desbotar ao sol
incomodando os pássaros cada vez menos (...)

perguntem-lhe por mim e
se pode vir
para recolher o
meu corpo no fim
só bulido pelo vento

e se o vento é conjunto
de pássaros invisíveis ou seres
tão claros , escondam que sou
cruel, que fico a debulhar
anjos como flores para saber
se bem ou mal me quer (...)

meu amor inventado
ainda assim tanto demoras

quantas vezes te inventei
ao pé das
águas do lago e
imaginei que me empurravas
ladeira abaixo
para enfim
morrer de amor (...)

terás de perdoar a
tristeza do meu corpo, ele
não entende o que estou
a fazer

e se alguma vez me
vires nos teus sonhos
sacode-me a terra ao coração (...)

e faz-me sempre assim,
empoleirada nos telhados
a enganar os girassóis (...)

abençoo-te para sempre
e é assim que morro, corajosa
a escrever um livro de
amor sem chorar

O resto da minha alegria, Valter Hugo Mãe